Se o nosso primeiro capítulo contou a história do nascimento do Flamengo, este é sobre como ele ganhou sua alma. No período entre 1941 e 1973, o clube deixou de ser uma potência do Rio para se tornar uma paixão que incendiava o Brasil. Foi a era do futebol-arte, quando craques geniais vestiram o Manto Sagrado e transformaram o recém-nascido Maracanã em nosso terreiro. Foi aqui que o apelido "Mais Querido" se tornou um fato incontestável e que o mundo conheceu os primeiros heróis de uma nação que aprendia a se orgulhar. Prepare-se para conhecer o esquadrão que ensinou o Brasil a amar o futebol bonito e transformou o Maracanã no maior palco do mundo, pintado de vermelho e preto.
O "Rolo Compressor" dos Anos 40 e o Primeiro Tricampeonato
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A década de 1940 foi mágica. O Flamengo montou um time que não apenas vencia, mas encantava. Era um futebol técnico, envolvente, que ficou conhecido como o "Rolo Compressor". A espinha dorsal desse esquadrão era formada por três dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro:
Domingos da Guia: O "Divino Mestre". Um zagueiro com uma elegância e técnica tão impressionantes que ele não desarmava os adversários; ele os desapontava. Domingos transformou a defesa em arte.
Leônidas da Silva: O "Diamante Negro". Famoso mundialmente por popularizar a bicicleta, Leônidas era um atacante espetacular, ágil e imprevisível. Sua presença no time era garantia de espetáculo.
Zizinho: O "Mestre Ziza". Considerado por muitos, inclusive por Pelé, um dos jogadores mais completos de todos os tempos. Zizinho era o cérebro do time, um camisa 10 que driblava, passava e finalizava com uma genialidade rara.
Sob a batuta desses craques, o Flamengo conquistou o seu primeiro Tricampeonato Carioca (1942, 1943, 1944), um feito que marcou uma era e estabeleceu um novo patamar de domínio no futebol carioca.
A Coroação no Maracanã: O Templo Veste Vermelho e Preto
Em 1950, o Rio de Janeiro inaugurou o maior estádio do mundo para a Copa do Mundo: o Maracanã. Para o Flamengo, o "Maraca" não foi apenas um novo campo; foi a coroação. O estádio, com sua capacidade para mais de 150 mil pessoas, era o palco perfeito para a torcida que mais crescia no país.
Foi ali que o Flamengo e sua gente se encontraram de forma definitiva. Os jogos do Mengão se tornaram eventos épicos, com um mar de gente empurrando o time. O Maracanã se tornou nossa casa, o caldeirão onde a Nação Rubro-Negra mostrava sua força e ajudava a construir vitórias inesquecíveis.
O Segundo Tri e os Artilheiros dos Anos 50
A mística do Maracanã impulsionou uma nova geração de heróis. Se os anos 40 foram de Zizinho, os anos 50 viram o surgimento de novos ídolos que levaram o Flamengo a mais um feito histórico: o segundo Tricampeonato Carioca (1953, 1954, 1955).
Neste período, brilharam craques como Dequinha, um volante incansável, e Evaristo de Macedo, um atacante letal que mais tarde faria história no futebol espanhol. Mas o grande nome que conectou essa geração foi Dida. Com uma incrível capacidade de finalização, Dida se tornou o segundo maior artilheiro da história do Flamengo, com 264 gols. Sua importância foi tão grande que ele se tornou o primeiro grande ídolo de um garoto de Quintino que, anos depois, se tornaria nosso Rei: Zico.
Anos de Transição e o Nascimento de um Símbolo: O Urubu
A década de 60 foi um período de transição, com títulos importantes (Carioca de 1963 e 1965, Rio-São Paulo de 1961), mas sem o mesmo domínio das décadas anteriores. No entanto, foi nesses anos que o Flamengo ganhou um de seus maiores símbolos, nascido do preconceito para se tornar um emblema de orgulho.
As torcidas rivais, de forma pejorativa e racista, chamavam os flamenguistas de "urubus". Em 31 de maio de 1969, durante um jogo contra o Botafogo, um grupo de torcedores decidiu ressignificar o insulto. Eles soltaram um urubu de verdade no gramado do Maracanã. A ave sobrevoou o campo, a torcida foi ao delírio e o Flamengo venceu o jogo por 2 a 1. Naquele dia, o Urubu foi adotado como mascote, representando a força, a astúcia e a imensa identidade popular da Nação Rubro-Negra, preparando o terreno para a era mais dourada que estava por vir.